sábado, 16 de julho de 2011

I

O meu altar
É um banco
De jardim
Para onde subo
E vejo o céu.

E o céu sobe
Sobe muito.
É tão alto
Como cair
A meio de um sonho.


II

O meu altar
Já não existe
O seu muro é alto
Sonhei-o bem.

Só vejo cinzento.
Dantes via
Azulejos.


Gonçalo Limpo de Faria, Setembro 2010

domingo, 27 de dezembro de 2009

Descalço

Lá do alto da falésia
Vi abrir o fundo o Mar.
Descalço, furei a brisa
Tornei-me seu
Fiquei sem ar.

Morri só nele horizonte
Tão feliz fui maresia.
Descalço, subi ao Céu
Não era morto
Asas batia!

Pairei eu mistério azul
Sem rosto leve andorinha
Descalço, perdi-me Além
Voei divino
Já nada tinha.


Gonçalo Limpo de Faria

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Os sonhos sussurram

sussurram

sussurram

Sussurram e despedem-se

Virando costas.



Depois regressam, e sussurram

sussurram 

e suspiram

Suspiram e desabafam

Soprando ao ouvido.



Remexem lençóis, e estremecem

estremecem

estremecem

Até que incomodam.

Eles anseiam ser sonhados.



Frustrando-se, aí enfurecem-se

e riem-se

riem-se muito.

É quando se apercebem

Que já não são sonhos.



Que falem, então.

Adormeci.



Não lhes vou dar esse prazer.



Gonçalo Limpo de Faria, Dezembro de 2009

sábado, 11 de outubro de 2008

Alma

Entre um olhar e a alma
Está um instante
Apenas um

Em que a pupila cruza o negrume
De um estranho fulgor inocente
E o quebra e o trespassa
Docemente, subtilmente

Em que o abismo cede
A ponte baqueia
E a íris estremece
Na cor fremente, cheia

Em que a pura nascente
Cai num pranto suave
Sorrindo levemente
Sem engodo, sem entrave

E na claridade de um reflexo
Sereno, qual lágrima escorrida
Nele assim encontro, perplexo


A tua alma sem vida


Gonçalo Limpo de Faria, Junho de 2007

Ser

Nada do que é
se transparece
apenas anoitece
e deixa de o ser

Tudo o que é
é um espelho
escuro e velho
do que seria
se fosse algo

E o reflexo
é só e sim
algo sem nexo
é o que queremos
que seja

Ficam assim
os meros acasos
simples e rasos
do será, terá sido


Gonçalo Faria, Julho 2007

Agora

Agora
Chamo-as lassas
As palavras de outrora.

Agora
Choro pedras
O coração as devora.

Agora
Adormeço surdo
Esqueço a aurora.

Agora
Contorço-me à dor
Que o meu ser ignora.

Agora
Calei a alma
Fugiu, foi-se embora.


Gonçalo Faria, Setembro de 2007

Findo

De minha sorte
lamento apenas
os amargos poemas
que choraram de morte

por eles me ouvi
chorando, morrendo
traído, entendo
que era por ti


Gonçalo Faria, Setembro de 2007